Descrição
Maria Adelaide Calado continua a perguntar insistentemente neste seu último livro: “Quem sou eu?” Queria-se pois em construção a vida inteira, sem nunca deixar de regressar às imagens que de si encontrava no espelho: flor de giesta, tojo ou rosmaninho. Ou ao berço de que não se afastou: filha da brancura do monte e das searas ondulantes. Sabia-se igualmente afirmativa, mesmo tenaz, e ao mesmo tempo doce e compassiva. Tinha um pacto com Deus que a apaziguava e a fortalecia e encontrava no mundo as alegrias que tão bem sabia cultivar e as interrogações que lhe alimentavam o intelecto e a vontade de participar. Foi protetora da língua portuguesa e de todos os meninos a quem a ensinou e que ajudou a crescer muito para além das matérias de estudo. Assumia-se conservadora, em contra corrente face ao moderno e inabalável elogio da mudança; sobretudo conservadora da memória e do tempo, que passam também pelo cultivo dos rituais e das tradições, ingredientes que ademais ocupam um lugar de relevo nos seus textos. E ainda assim assombrosamente adaptável e atualizada, quando tal lhe era exigido por força das circunstâncias – que eram para ela as da cidadania e sempre em primeiro lugar as dos afectos. Sonhadora e lírica, romântica inveterada, Mãe e amorosa sobre tudo o resto.
Isabel Calado
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Há vidas que se libertam do tempo e, no entanto, são enraizadas no tempo que percorreram. A vida da escritora foi assim: ancorada, como poucas, na memória de todos os seus passos e, do mesmo passo, apontada sempre a um outro tempo (o futuro?) liberto de todas as amarras. Essa tensão virtuosa entre a saudade e a utopia fizeram da vida da escritora um encantamento para quem com ela viveu. A ida ao passado para buscar nele a beleza que só o coração consegue ver e a projetar na sociedade que está por inventar foi a permanência da vida da escritora. Nós damos graças por essa vida grande.
José Manuel Pureza